Vários factores ditam a emigração ou fuga de mão de obra/capital humano, factores estes que vão desde económicos a culturais. Entretanto, a grosso modo, o fim último sempre é a busca por uma qualidade de vida melhor – a busca de uma vaga de emprego.
“Enquanto residia no Brasil, vi jovens ganeses e haitianos aglomerados em um pequeno apartamento, sedentos em encontrar um emprego (qualquer que fosse), dentre eles, juristas e engenheiros. Igualmente, constantemente me deparava com angolanos – alguns graduados, outros especialistas, não exercendo suas carreiras de profissão, sujeitando-se a meros biscatos ou bicos, com receio de voltarem para Angola e não terem oportunidades de emprego ou de desenvolver suas distintas habilidades profissionais” – (QUINGURI, 2021).
O ESTADO E O DESEMPREGO – DISCUSSÕES TEÓRICAS
Alguns celebres economistas, principalmente os da “ala direita” ou “ortodoxos”, argumentam que não é tarefa do Estado gerar ou dar empregos aos seus cidadãos – isso deve ser feito unicamente pela dinâmica endógena dos mercados. Ao intervir no mercado de trabalho para tentar solucionar o problema do desemprego mediante leis trabalhistas, sindicatos, e/ou salários mínimos, o Estado estaria gerando desequilíbrios económicos que levariam ao aumento da taxa de desemprego. A estreita relação entre “Estado e Empregabilidade” emancipa-se após o surgimento do Estado Moderno, aparece, então, o emprego como Inscrição Social e Jurídica da participação dos indivíduos na produção de riqueza, sendo que o desemprego poderá ser definido como seu negativo.
Entretanto, economistas da “ala esquerda” ou “heterodoxos”, enxergam nas políticas do Estado soluções para resolução do alto índice de desemprego nas nações, com a implementação de seguro desemprego e demais medidas trabalhistas de modo a proteger e assegurar o trabalhador. A literatura envolvendo tal discussão é robusta e complexa, discutida entre distintas linhas de pensamento económico a centenas de anos, questionamentos envolvendo a existência ou não existência do desemprego involuntário seguem até hoje. Não fazendo parte do escopo deste artigo a discussão de tal questão, vejamos então, o desemprego/emprego como é comummente abordado ou definido nos seios académicos contemporâneo.
EMPREGO E DESEMPREGO
Por ser um indicador da atividade agregada, o PIB é, obviamente, a principal variável macroeconómica. Duas outras — desemprego e inflação — revelam outros aspectos importantes do desempenho de uma economia. 1) Nível de emprego é o número de pessoas que têm trabalho. 2) Nível de desemprego é o número de pessoas que não têm trabalho, mas estão à procura de um (desemprego involuntário). 3) Força de trabalho é a soma dos níveis de emprego e desemprego.
Não obstante, identificar se alguém está empregado é fácil; entretanto, determinar se alguém está desempregado é mais difícil. De acordo com a definição anterior, para ser considerada desempregada uma pessoa deve atender a duas condições: 1) estar sem trabalho e 2) estar procurando emprego. Esta segunda condição é mais difícil de avaliar.
Normalmente, apenas aqueles que estão procurando emprego são computados como desempregados; os que não têm trabalho e não procuram uma vaga são considerados fora da força de trabalho. Quando o nível de desemprego é alto, alguns desempregados desistem de procurar emprego e, por isso, não são mais contados como tal. Um exemplo extremo: se todos os trabalhadores sem emprego desistissem de procurar uma vaga, a taxa de desemprego seria igual a zero e se tornaria um indicador muito enviesado do que está acontecendo no mercado de trabalho.
COMO É CALCULADA A TAXA DE DESEMPREGO?
Hoje em dia, a maioria dos países ricos se apoia em amplas pesquisas domiciliares para calcular a taxa de desemprego. Nos Estados Unidos, essa pesquisa é chamada de Current Population Survey (CPS) e baseia-se em uma entrevista mensal realizada com 60.000 domicílios. A pesquisa classifica uma pessoa como empregada se estiver trabalhando no momento da entrevista, e como desempregada se não tiver trabalho mas estiver procurando uma vaga nas últimas quatro semanas. A maioria dos países adota uma definição semelhante de desemprego. Após várias pesquisas, o resultado de como a taxa de desemprego em Angola é exactamente calculada ficou inconclusiva. O Instituto Nacional de Estatística não tem tornado publico os seus métodos de calculo em detalhes. Entretanto, nos foi passado que em 2020 a taxa de desemprego no país chegou a 34%.
PORQUÊ EMIGRAMOS?
Sempre foi comum vermos jovens angolanos/africanos com cursos superiores concluídos abrir mão de suas famílias, povo e cultura em troca de oportunidades de emprego em países mais desenvolvidos, o fenómeno não é novo, mas não para de aumentar. Normalmente, muitos dos emigrantes acabam sendo garçons, coletores de lixo, babás, vendedores ambulantes, metalúrgicos, ajudantes de pedreira, repositores de estoque em supermercados e demais carreiras tidas como “humildes” no mundo contemporâneo. Entretanto, os principais motivos que fazem com que muitos emigrem não necessariamente é a vontade de executar serviços ou “trabalhos humildes”, mas a ambição de auferirem uma fonte de renda melhor e maior qualidade de vida – por mais “desprezível” que seja o setor em que estiver empregado. Portanto, vale lembrar que, nos países mais desenvolvidos, por mais que vivamos de biscatos ou “trabalhos humildes”, consegue-se ter acesso a serviços sociais/públicos e não só, de maior qualidade e eficiência.
O fardo em alguns países africanos parece ser tão pesado de carregar, que muitos ignoram os riscos da emigração clandestina. No Senegal, alguns pais vão ao ponto de obrigar as suas crianças a abandonarem o continente africano em direcção a Europa – como reportado pela DW[1]. A pressão social, faz com que muitos procurem abandonar o país/continente.
Visto que, no mundo contemporâneo tudo gira em torno do dinheiro, uma pessoa sem emprego não perde apenas sua renda, mas com frequência a sensação de que não está cumprindo os deveres esperados dela como ser humano.
Longe de conflitos civis, a grosso modo, para os angolanos – o alto índice de desemprego e baixa qualidade de vida tem configurando-se como os principais motivos a fazer com que muitos jovens busquem os países mais desenvolvidos para tocar a vida. No Brasil, até 2019, angolanos, venezuelanos e congoleses foram mais da metade dos “refugiados vulneráveis” atendidos em São Paulo. Angolanos chegaram a representar a maior parte do agregado com 20%[2] de representatividade.
DIFERENÇAS SALARIAIS
O salário mínimo angolano segue sendo baixo pelo tanto de despesas essenciais correntes que o mesmo não pode cobrir, enquanto isso, de modo geral a inflação continua alta, a moeda é uma das que mais se desvalorizou na região, políticas de austeridade tem sido levado a cabo, dívida publica não para de crescer e a cada novo dia o futuro da macroeconomia se torna mais imprevisível.
Em média, um policial agente terceira, ganha um salário mensal em torno de (Kzs 130.000,00~150.000,00), um professor do ensino fundamental no mercado privado (Kzs 20.000,00~40.000,00), um aspirante militar (140.000,00~160.000,00) e um auxiliar administrativo (Kzs 60.000,00~120.000,00).
Enquanto isso, no Brasil[3] um coletor de lixo aufere um salário mensal equivalente[4] a (Kzs 152.000,00) e nos EUA[5] o equivalente a (Kzs 1.970.000,00). Um auxiliar administrativo na Alemanha[6] (Kzs 1.432.350,00) e um garçon na Itália (Kzs 1.022.580,00). Logo, muitos acham mais viável ser um coletor de lixo nos EUA ou garçon algures na Europa – a dispor de um salário maior e melhor qualidade de vida do que ser um professor, agente policial ou mesmo engenheiro em Angola onde o índice de desenvolvimento humano é baixo.
Além dos salários serem baixos, em Angola os trabalhadores são obrigados a pagar impostos sobre a renda/consumo (IVA e IRT) e outros tantos vigentes no país. O que faz com que, muitos, embora empregados continuem objectivando abandonar o país.
Entretanto, vale lembrar que, apesar dos custos de vida[7] serem altos em muitos países ricos ou desenvolvidos, o rendimento salarial médio é suficiente para cobrir despesas essenciais correntes e ainda cobrir determinada margem de poupança ou acumulação de dinheiro/capital. “Nestes países, os cargos menos qualificados oferecem salários ainda maiores que muitos cargos de alta qualificação nos países pobres”.
De longe e sem binóculos, é possível enxergarmos que, quanto mais desemprego haver, quanto mais os nossos salários forem desvalorizados, maior será a proporção de jovens querendo abandonar pais – e vice-versa.
PORQUE OS SALÁRIOS SÃO BAIXOS NOS PAÍSES POBRES E ALTOS NOS PAÍSES RICOS?
Os factores que ditam a diferença salarial entre países ricos e pobres são muitos e distintos, o principal deles é o baixo índice de produtividade que os países pobres apresentam, associado ao baixo índice de capital humano, deficiências estruturais na macroeconomia e o escasso acesso a tecnologias associadas aos factores de produção.
No que tange ao mercado de trabalho, apesar de algumas empresas serem tidas como exploradoras pela contratação de mão de obra barata mesmo que estejam registando lucros milionários, normalmente, os salários baixos são frutos de uma produtividade extremamente baixa. Entretanto, mais do que criar leis trabalhistas como seguro desemprego ou aumento do salário mínimo, devíamos nos preocupar em como alavancar a produtividade dos trabalhadores nos países mais pobres.
As nações já perceberam que nenhuma delas consegue se desenvolver com salários baixos, é preciso que haja um equilíbrio entre aumento de salários e aumento da produtividade, deve existir uma relação directamente proporcional entre ambos. "Se os salários aumentam e a produtividade não, o país se torna pouco produtivo e competitivo, facto que pode gerar pressão inflacionaria e outros males de natureza macroeconómica.
FUGA DE CAPITAL HUMANO E SUAS CONSEQUENCIAS PARA ECONOMIA
A diminuição da fuga de capital humano em Angola, pode ser alcançada mediante políticas macroeconómicas efetivas visando a diminuição do desemprego e aumento da qualidade de vida do cidadão. Os jovens não procuram muita coisa além de uma fonte de renda solida e constante, independente de advir de um negócio próprio ou de terceiros.
Segundo PNUD, a Etiópia perdeu 75% da sua mão de obra entre 1980 e 1991 o que muito prejudicou a capacidade de desenvolvimento deste país, até então, muitos países do continente seguem registando perca de quadros qualificados. A fuga de pessoas com aptidões técnicas ou de conhecimentos, além de reduzir o índice de mão de obra qualificada, fragiliza o mercado de trabalho e abre porta para importação de prestadores de serviços estrangeiros, gerando custos avultados para o governo e a sociedade civil. A perca massiva de quadros qualificados em países subdesenvolvidos tem sido um dos fatores que negativamente tem impactado o bom desenvolvimento económico destes.
PRESSÃO SOCIAL, DESEMPREGO E SAÚDE PUBLICA
O baixo índice de empregabilidade é ameaçador, suas consequências vão além de desajustes macroeconómicos e contração do fluxo circular da renda ou riqueza. Antes de ter uma fórmula de geração de emprego é prioritário um diagnóstico correto e concreto da situação critica que leva ao desemprego. Para compreender o desemprego de longa duração e a exclusão, não se pode dissociar as dimensões económicas das outras dimensões sociais. Somente a economia não bastaria para dar as chaves da resolução da nova questão social – pois, a crise do desemprego não abala apenas a economia, mas também determinada sociologia. Quando o desemprego é prolongado, tende a levar o desempregado ao empobrecimento ou perda de determinado status social outrora alcançado, o que pode trazer à tona um grande problema de saúde publica.
A literatura sobre desemprego e saúde tem se mostrado consistente (apesar de determinada subjetividade na conclusão dos dados estatísticos) em demostrar a elevada morbimortalidade associada ao desemprego. Uma pesquisa encabeçada pela revista Harvard Public Health[8] abordando o elevado índice desemprego após a crise de 2008 concluiu que: Aumentaram em mais de 80% as chances de novos problemas de saúde provavelmente desencadeados pela perda de empregos – condições relacionadas ao estresse, como acidente vascular cerebral, hipertensão, doenças cardíacas, atrite e problemas emocionais e psiquiátricos.
Entre os desempregados de longa duração é maior a probabilidade de exposição ao alcoolismo e uso de outras substâncias psicotrópicas, desde liambas, tabacos e alimentos mal nutritivos. Tal realidade é facilmente diagnosticada nos guetos de Angola, principalmente Luanda. Como frisado anteriormente, muitos jovens se enxergam em situação de inutilidade com relações familiares destruídas e amizades prejudicadas. Em um estudo[9] sueco sobre o efeito a longo prazo do desemprego, os pesquisadores concluíram que: A mortalidade relacionada ao álcool foi significativamente aumentada entre homens e mulheres que perderam o emprego.
SOLUÇÕES ECONÓMICAS – VIAS PARA REDUÇÃO DO DESEMPREGO EM ANGOLA
Os economistas e não só, devem se preocupar com a questão do desemprego principalmente por dois motivos: O primeiro deles, - por causa de seus efeitos diretos sobre o bem-estar dos desempregados. O segundo motivo pelo qual os economistas se preocupam com a taxa de desemprego, - que ela sinaliza que a economia pode não estar usando alguns de seus recursos. Quando o nível de desemprego é elevado, muitas pessoas que querem trabalhar não encontram ocupação; a economia não está usando de forma eficiente seus recursos humanos.
A grosso modo, é o sector privado, formal e informal o responsável por criar maior parte dos empregos no mundo todo, acredito piamente que, indubitavelmente, a solução passa pela criação de condições de modo a fazer com que agentes económicos possam operar com maior eficiência – por melhorar as questões que debilitam o nosso ambiente de negócios. A questão passa por provisionar: a) Facilidade para aberturas de empresas e licenças para construção; b) Redução do tempo médio para obtenção de água e energia eléctrica após abertura de investimentos; c) Facilidade no registo de propriedade e obtenção de crédito; d) Protecção a pequenos investidores – sejam estes operantes no mercado formal ou informal e) Desburocratizar negociação além fronteiras (importação/exportação); f) Alargar (para mercados informais) e reduzir carga tributaria; g) Facilitar execução de contratos e resolução de insolvências; h) Melhorar o acesso a bens de capital e meios tecnológicos de modo a acelerar a produtividade nacional.
O mercado tem a solução para a redução do desemprego, desde que, juntos – governo e sociedade civil se empenhem para superar empecilhos e equilibrar variáveis macroeconómicas, nomeadamente: desvalorização cambial e inflação.
As nações que não conseguirem aumentos significativos de produtividade, equilibrar suas moedas, apostar em sectores económicos mais complexos, na formação e qualificação de trabalhadores, vão estar condenados a ser reféns dos mercados internacionais mais intensivos em capital e produtividade.
CONSELHO AOS EMIGRANTES ANGOLANOS
Sem barreiras a quem queira emigrar, entretanto sigo aconselhando, não emigre apenas por uma vaga de emprego, vá atrás de mais formação, intercâmbio de conhecimentos, crescimento pessoal e profissional, para num futuro breve ou tardio agregar ao desenvolvimento do país. Vamos emigrar até quando, nossos filhos e netos correm o risco de também emigrar em busca de melhores condições de vida se não passarmos a fazer por nós, pelo desenvolvimento do nosso país.
Por: Alexandre Francisco Quinguri.
[1] https://www.dw.com/pt-002/fam%C3%ADlias-africanas-e-a-imigra%C3%A7%C3%A3o-clandestina/a-36591459
[2] https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2019/10/23/angolanos-venezuelanos-e-congoleses-sao-mais-da-metade-dos-refugiados-vulneraveis-atendidos-em-sp-veja-mapa.ghtml
[4] Média cambial verificada no mês de janeiro/2021
[5] https://money.usnews.com/careers/best-jobs/garbage-collector/salary
[7] https://www.expatistan.com/pt/custo-de-vida/pais/classificacao
[9] https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5054271/
wah... like it
ResponderEliminarTantks.
Eliminar